É a vida, cheia de paradoxos. É a vida correndo solta, dando tudo o que pedimos, quando pedimos. E não tem nada mais dadivoso do que a natureza respondendo à simples pergunta: posso entrar? Claro que pode. A natureza trata bem quem lhe trata bem. Isso se chama receber, receber é mais do que abrir a porta. Receber é um sorriso com café. É um monte de palavras que muitas vezes não dá para entender, tão rápido são pronunciadas. Receber é uma das mineirices mais gostosas.
É mineiríssimo receber com café, com bolo, doce de leite. E, acima de tudo, com tempo. Esse o grande tesouro da roça: tempo. Tempo para olhar a planta crescer, para depois colher. Tempo para ver a vaca dar leite, o boi engordar, a galinha encher o papo. Quem vem para Minas vai reencontrar o tempo. O tempo de comer, sentado, à mesa, com uma prosa descontraída. O tempo sem pressa nenhuma. Porque a gente só corre para fazer e acabar logo aquilo que não gosta. Porque o que é gostoso não tem tempo, é para viver.
Quem deixa o conforto de seu apartamento para pôr o pé no pó de uma estrada de terra, hoje em dia, vai encontrar uma roça com fogão à lenha e mp5 ou 6. Na mesa, com toalha xadrez, não vai ter sousplat, talher para entrada, prato principal e sobremesa, o garçon deve ser um filho da casa e o cardápio todo está no fogão. Não é mais o comer por sobrevivência, é o receber por gosto. Esse gosto de comida fresquinha, que compartilha a mesma colher na panela aberta, e que lembra uma mãe, uma tia, uma vó, uma culinária quase feminina de tanto que é perfumada, isso é raiz, é cultura. E gastronomia é isso, o prazer sem culpa nenhuma.